Aquecimento global versus mudanças climáticas: por que precisamos entender a diferença

Riscos e resiliênciaArtigo16 de setembro de 2021

Para muitas pessoas, o aquecimento global parece atraente. Precisamos corrigir esse mal entendido para garantir que todos estejam cientes da necessidade urgente de se combater as mudanças climáticas.

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Escrito por Sean McAllister

Glasgow foi aquecida por um verão glorioso. A cidade escocesa, que será sede da conferência climática COP26 em novembro, disfrutou do seu terceiro julho mais quente já registrado, além de ter sido muito mais seco e ensolarado do que a média.
Seus moradores podem ter sido impedidos de passar as férias no exterior, mas não importou, porque este ano o verão mediterrâneo foi até eles. Não intencionalmente, os habitantes de Glasgow podem acreditar que estão vendo os benefícios do aquecimento global.

E é nisso que está o grande problema. Para muitas pessoas, principalmente aquelas que vivem em climas mais frios, o aquecimento global parece atraente. Invernos mais amenos, verões mais ensolarados, como não gostar disso?

O termo “aquecimento global” é parte do problema. Um aumento constante na temperatura média parece mais adequado. Somando-se à confusão, os termos “aquecimento global” e “mudança climática” são frequentemente usados como sinônimos. Essa interpretação incorreta é usada constantemente por negacionistas climáticos como resposta: “por que fazer alguma coisa se apenas o que acontece é que temos mais luz solar?”

Bom, vamos começar do início. Aquecimento global e mudanças climáticas são diferentes, mas existe uma relação de causa e efeito. Os dois são ruins para o planeta e para o nosso futuro. E como confirmado pelo relatório recente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), ambos são predominantemente causados pelo comportamento humano. Sim, processos naturais também contribuem, incluindo padrões cíclicos do oceano como El Niño e La Niña, e até mesmo a forte atividade vulcânica. Porém, somos os maiores culpados pela atual taxa acelerada de mudança climática e, assim, cabe a nós resolver isso.


O que é aquecimento global?

O aquecimento global diz respeito ao aumento da temperatura média global da superfície terrestre, que aumentou 1.2°C acima da linha de base pré-industrial. E, de acordo com o IPCC, pode atingir 1.5°C já em meados da década de 2030.
Um aumento de 1.2°C ou 1.5°C ao longo dos últimos 150 anos ou mais não parece muito ameaçador. Mas é.

Um pequeno aumento na temperatura global média pode ter um grande efeito. O IPCC relata que cada acréscimo de 0.5°C de aquecimento global provoca “aumentos claramente discerníveis na intensidade e frequência de extremos de alta temperatura, incluindo ondas de calor, bem como secas agrícolas e ecológicas”. Até mesmo Glasgow, com suas temperaturas de verão relativamente modestas, foi alertada sobre a escassez de água no final de julho com pedidos para que as empresas e as pessoas preservassem os recursos hídricos.

Já estamos testemunhando ondas de calor em áreas consideradas de clima mais frio. Basta olhar para as temperaturas recordes que afetaram o oeste da América do Norte durante o verão de 2021. Várias cidades dos estados Oregon e Washington dos Estados Unidos e as províncias do oeste do Canadá ferveram em temperaturas muito acima de 40°C.

A onda de calor chegou com um alerta adicional para Glasgow quando a vila de Lytton, na Colúmbia Britânica, estabeleceu um novo recorde de temperatura canadense de 49.6°C. Lytton está situada a 50 graus de latitude ao norte - apenas cinco graus ao sul de Glasgow. Se temperaturas extremas como essas atingirem o extremo norte, então Glasgow não pode presumir que ficará imune a ondas de calor parecidas no futuro.


O que é mudança climática?

A mudança climática engloba critérios mais amplos. Fundamentalmente, o aquecimento global é um tipo de mudança climática que está gerando uma cascata de efeitos colaterais. Existem impactos óbvios relacionados ao aquecimento como ondas de calor, secas e incêndios florestais. Mas, há outros efeitos que são considerados mudanças climáticas. Por exemplo, o aquecimento derreterá as calotas polares, o que aumentará os níveis do mar e ameaçará as comunidades costeiras. Mais aquecimento causará a diminuição das geleiras nas montanhas, das quais milhões de pessoas dependem para ter água potável e agricultura.

John Scott, Head de Riscos de Sustentabilidade do Grupo Zurich, acredita que as pessoas precisam entender melhor as consequências do aquecimento do planeta. “A maioria das pessoas pensa ‘ah, as coisas estão ficando só um pouco mais quentes’, mas é muito mais complexo do que isso”, diz ele.

“Há evidências de que o aquecimento global está influenciando o comportamento da corrente de jato. Isso tem o efeito de localizar os sistemas climáticos por semanas a fio, causando chuvas prolongadas, seca, geada ou calor. A maioria dos cientistas do clima concorda que, com o tempo, o aquecimento global agravará os eventos climáticos caóticos e severos. Tempestades tropicais provavelmente se tornarão mais impactantes, com velocidades de vento mais altas, maior extensão da aérea, mudando seus caminhos comuns e se tornando tempestades tropicais extras ou eventos de inundação de tempestade quando elas finalmente atingirem a terra”.


Adaptação a um mundo mais quente e imprevisível

No entanto, Glasgow está se preparando para esses riscos. Em julho, enquanto seus residentes aproveitavam a luz do sol, a cidade de Glasgow lançou a Estratégia de Adaptação Climática e Plano de Ação com duração de uma década.

O relatório reconhece que Glasgow tem a possibilidade de sofrer com condições climáticas mais extremas. Ele alerta para chuvas de inverno mais fortes e diminuição das chuvas de verão, mais ondas de calor, aumento do nível do mar e erosão costeira, além de maior probabilidade de inundações, seja de rios, águas superficiais ou costeiras. Ele ainda representa risco para os estoques de carbono no solo, plantações, gado e biodiversidade de água doce. A interrupção das cadeias de abastecimento e redes de distribuição é outro motivo de preocupação.

Todos esses riscos, afirma ele, podem causar o aumento do desemprego e a ampliação das divisões econômicas e sociais. Mas, se Glasgow fortalecer sua resistência às mudanças climáticas, poderá florescer em um novo clima e aproveitar novas oportunidades, acrescenta o relatório.

Isso exigiria, por exemplo, reformar casas e escritórios para ondas de calor, proteger estradas e ligações ferroviárias contra inundações e plantar 20 milhões de árvores para resfriar a cidade durante altas temperaturas e reduzir o risco de inundações.

“As mudanças climáticas impactarão diferentes partes do mundo de maneiras diversas, mas ninguém ficará imune de seus efeitos colaterais”, diz Amar Rahman, Global Lead for Climate Change Resilience Services da Zurich. Ele acredita que, como aconteceu em Glasgow, todas as cidades, regiões e países precisam desenvolver planos para se adaptar e construir resiliência às mudanças climáticas.

“Mesmo se limitarmos o aumento de temperatura a 1.5°C, já estamos sofrendo os riscos físicos associados às mudanças climáticas. Devido ao acúmulo de emissões na atmosfera, podemos até ver um aumento na frequência e gravidade dos desastres naturais. E isso antes de começar a considerar os riscos físicos de longo prazo, como a elevação do nível do mar”, acrescenta Rahman.


Cenário do Armagedom

Há outro possível efeito colateral de longo prazo do aquecimento global que teria consequências graves para Glasgow: o colapso da Corrente do Golfo, ou como os especialistas a chamam, a circulação de revolvimento meridional do Atlântico (AMOC).
“O que é isso?”, você pergunta. É uma corrente marítima que conduz água quente e salgada do Golfo do México até a região nordeste do Atlântico. Afeta o clima, os ciclos sazonais e a temperatura na Escócia e em outras partes do oeste e do norte da Europa. Por exemplo, é por isso que em janeiro, Glasgow tem uma temperatura média de 3°C, enquanto Moscou - que está na mesma latitude - sofre com uma média de -7.9°C.

Porém, o derretimento do gelo polar diluiria a água salgada do mar no Atlântico Norte e potencialmente desativaria o motor que impulsiona a circulação do oceano. Pesquisas sugerem que a Corrente do Golfo está perdendo estabilidade e está no ponto mais fraco em 1.000 anos. Caso entrasse em colapso, teria um grande impacto no clima da Escócia e até mesmo faria com que a produção de safras despencasse, incluindo a cevada, a principal safra de cereais da Escócia.

A cevada também é o ingrediente essencial para a produção de whisky escocês. Silenciosamente, a população de Glasgow está percebendo que o aquecimento global é um fenômeno ruim e que precisamos enfrentar as mudanças climáticas com urgência.


Tempo versus Clima: qual é a diferença?

O tempo refere-se às condições atmosféricas que ocorrem localmente durante um período de tempo limitado - de horas a dias. Exemplos comuns incluem chuva, neve, granizo, ventos ou tempestades.

O clima está relacionado às condições atmosféricas médias em um determinado local durante um longo período de tempo. Pode incluir padrões médios de temperatura, umidade e precipitação ao longo das estações, anos ou décadas. Portanto, a mudança climática se refere a uma mudança de longo prazo nas condições atmosféricas médias.